Pelo menos 70% das crianças com enurese tem algum
parente que apresentou esse problema na infância.
Quais são os Critérios Diagnósticos nos casos de
enurese e encoprese?
Tanto a enurese (falta do controle de urina) quanto
a encoprese (falta de controle das fezes) implicam deficiência no controle de
esfíncteres, respectivamente vesical e anal, em uma idade em que a maioria das
crianças já tem esse domínio. Assim, são consideradas enuréticas ou
encopréticas as crianças acima de cinco e quatro anos respectivamente, que
ainda não urinam ou não defecam nos locais destinados à eliminação.
Quando podemos suspeitar que a criança apresenta
efetivamente um problema de enurese ou encoprese?
O controle de esfíncteres se processa para a
maioria das crianças, de forma quase natural com o auxílio dos familiares,
através de um processo em geral denominado treino de toalete ou desfralde. Esse
processo se encerra, para a grande maioria das crianças ocidentais, por volta
dos três anos. De acordo com o DSM IV (APA, 1994) –Manual Estatístico dos
Distúrbios- as características e as variações dos dois distúrbios em termos dos
seguintes fatores: idade da criança, freqüência e duração dos episódios de
descontrole (“acidentes” ) Somente quando o descontrole dos esfíncteres da
criança perdura por um certo período (3m, no DSM-IV), apresenta-se com uma
certa freqüência (duas vezes por semana no caso da enurese e uma vez por mês na
encoprese), e incide numa criança que já passou dos cinco (para enurese) ou
quatro anos (para encoprese) é que deve passar a merecer a atenção do
psicólogo. A versão mais recente do DSM, entretanto, sugere ao psicólogo a
possibilidade de iniciar o processo de alteração do comportamento encoprético a
partir dos três anos de idade nos casos em que é muito grande o impacto social
negativo do descontrole sobre a família da criança.
Quando se tratam de transtornos emocionais, são
especificamente iniciados na infância?
Esses dois distúrbios independente de virem
acompanhados de outros transtornos emocionais são considerados distúrbios
típicos da infância. O controle fecal é, em geral, obtido antes do vesical
independentemente do sexo da criança, embora as meninas tendam a alcançar
qualquer um dos dois controles antes dos meninos.
É comum um parente biológico nestes dois
transtornos?
Pelo menos 70% das crianças com enurese tem algum
parente que apresentou esse problema na infância. No caso da encoprese,
especialmente no caso na retentiva cuja base reside na tendência à prisão de
ventre, também se associa o transtorno com bases orgânicas.
Existe uma conscientização por parte dos
profissionais da educação que estes podem ser atos involuntários?
Não. Essa conscientização é inexistente, assim como
os pontos relativamente fáceis de serem administrados e que favorecem
grandemente a prevenção desses transtornos. Há inclusive algumas sugestões aos
responsáveis pela criança sobre como proceder quando forem tentar ensiná-la a
usar o vaso sanitário. Algumas dessas sugestões são as seguintes:
1)A criança deve primeiramente se acostumar com a
presença do urinol, antes de aprender a usá-lo. Este deve ser colocado na
cadeira habitual da criança para que ela possa sentar-se o tempo que conseguir
(não mais que 5 ou 10 minutos), ainda que totalmente vestida. Esta fase é
planejada apenas para estabelecer o hábito de se sentar sobre o vaso sanitário.
É fundamental que essa atividade seja interessante e que os pais fiquem
sentados ao lado da criança e lhe dêem atenção ou leiam uma estória de modo a
entretê-la em outra atividade que não se sentar sobre o urinol.
2)Uma vez instalado o hábito de sentar-se sobre o
urinol, os pais deveriam passar, então, ao ensino de sentar-se sobre ele em
horários específicos (logo depois do café da manhã, por exemplo), mas agora sem
as roupas de baixo. Esta fase destina-se apenas a inspirar tranqüilidade na
criança acalmando o temor natural de que algo insuspeito possa ocorrer quando “o
xixi ou cocô” saem de dentro dela, inibindo dessa forma, a eliminação. Não deve
ser exigido da criança nenhum outro comportamento a não ser o de sentar-se em
horários definidos pelos pais.
3)Na terceira fase a rotina de sentar-se sem roupas
de baixo já está instalada e passa-se então a discriminar o local da eliminação
explicando a criança que o local próprio para fazer “xixi” ou “cocô” é o
urinol.
4)A próxima fase diz respeito ao ensino das
sensações proprioceptivas que antecedem os dois processos de eliminação.
Coloca-se, portanto o urinol próximo do local onde a criança gosta de brincar e
ocasionalmente pergunta-se a ela se está com vontade de ir “fazer xixi” ou
“cocô”. O objetivo desta fase é promover a autonomia infantil e, portanto
deve-se ensinar a criança a se liberar das roupas e a sentar-se no urinol
quando for necessário.
5)Uma vez adquirido o hábito de usar o urinol
deve-se transferi-lo para o de usar o vaso sanitário normal. Esta é a atividade
mais fácil de ensinar uma vez que o comportamento a ser ensinado pode ser
observado pela criança na interação com crianças mais velhas ou adultos da
família
6)Recomenda-se que o ensino de urinar de pé aos
meninos seja feito depois de obtido o treino de controle intestinal. É
importante o papel dos pais nessa aquisição, pois em geral os meninos ficam
orgulhosos de urinar como fazem os seus pais, especialmente se forem por eles
estimulados a assim agirem.
7)Outra recomendação é a de o treino noturno dos
esfíncteres só tenha início depois que o controle vesical e intestinal durante
o dia já tenha sido alcançado de forma duradoura. Algumas vezes a própria
criança manifesta interesse por dormir sem fraldas, ocasião em que alguns
hábitos relativos à saúde podem ser iniciados, como urinar antes de se deitar e
ir primeiramente esvaziar a bexiga ao levantar-se pela manhã.
E quando a incontinência é claramente deliberada,
como estes devem lidar no contexto da escola?
Para se ter certeza que a incontinência é
claramente deliberada, alguns exames médicos são necessários. Uma vez eximida a
hipótese de etiologia orgânica e tendo sido levantada a hipótese do ganhos
secundários nos transtornos, a criança e os familiares vão ter que ser
avaliados para se definir os antecedentes e conseqüentes que mantém o
comportamento para se definir a melhor estratégia a ser empreendida como forma
de tratamento abrangendo inclusive a orientação ‘a escola.
Que prejuízos emocionais podem ocasionar a enurese
ou encoprese?
Embora, dentre os diversos problemas
comportamentais infantis, a prevalência dos distúrbios de eliminação - enurese
e encoprese - não seja das mais significativas (com seus índices variando de
1,5%, a 5,7 %), seu impacto negativo é enorme sobre o desenvolvimento da
criança, especialmente considerando-se os prejuízos na socialização e na
auto-estima. Há indícios inclusive de que as crianças enuréticas inicialmente
não apresentem problemas emocionais mas passem a apresentá-los em função desse
processo.
Além da baixa da auto-estima, podemos observar
perturbações no ambiente e nas relações familiares. Como podemos ajudar esta
criança?
Grande parte das crianças enuréticas, atendidas no
Laboratório de Terapia Comportamental, verbalizam suas próprias dificuldades
nas relações familiares, fruto de seu problema de descontrole vesical ou fecal.
Essas dificuldades derivam de concepções equivocadas dos familiares acerca da
possibilidade de controle do problema pela criança/adolescente. Diferentemente
do que estes imaginam os enuréticos não são culpados pelo descontrole que
experimentam. Pensar diferentemente é contraproducente para a criança ou
adolescente e traduz uma intolerância ao transtorno. O melhor que podemos fazer
por essa criança ou jovem é não julgar que está nas mãos dele conseguir o
controle sozinho. Procurar ajuda de um psicólogo clínico é uma excelente idéia,
especialmente se este profissional tiver demonstrado em sua prática que detém o
domínio sobre como lidar com esses tipos de transtorno.
Publicado em 03/06/2003 10:59:00
Por: Edwiges Ferreira De Mattos Silvares - Profa
Titular do Departamento de Psicologia Clinica da USP;Professora orientadora e
supervisora na área de Psicologia Clinica Comportamental Infantil, no Departamento
de Psicologia Clinica da Universidade São Paulo por mais de quinze anos.Livros
publicados: Silvares, E.F.M. & Gongora, M.N.A.(1998) Psicologia Clínica
comportamental:a inserção da entrevista com adultos e crianças. Edicon S.Paulo,
150p. 02. Silvares, E.F. M.(Org.) (2000).Estudos de caso em Psicologia clínica
comportamental infantil: vol. 1 e vol.2 Campinas, Editora Papirus.
fonte: Psicopedagogia
Um comentário:
Meu filho tem 16 anos e ainda faz coco na cueca todos os dias,nao sei oque fazer.
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